5.10.2015
Pessimismo que se impõe
por Germano Rigotto
Quem me conhece sabe quão positivo costumo ser. Mas há sempre um pressuposto para que um otimista não se torne tolo: o realismo. E eu também gosto de estar muito atento à realidade. Então, quem olha para o Brasil, diante da conjuntura atual, não poderá ter muito otimismo. Pelo menos, não no curto prazo. Claro que nossas potencialidades poderiam, se bem utilizadas, nos lançar entre as grandes potências globais – e em não muito tempo. Mas, no estágio em que estamos, tanto econômico quanto político, as perspectivas não são as melhores. Além de ser uma quadra difícil da nossa história, o país não está sabendo sair desse cruzamento.
Os últimos movimentos do governo federal comprovam essa constatação. A presidente Dilma Rousseff anunciou uma reforma ministerial. Reduziu oito pastas, diminuiu salários, cortou cargos de confiança, remanejou funções, enfim, fez ajustes aqui e acolá para dar um sinal de mobilidade. Entretanto, o motor que conduziu toda essa mudança foi a velho e surrada barganha política. Não há projeto de nação sobre a mesa, não há agenda, não há transformação estrutural, não há desafio de engajamento, não há um norte. Há, de novo e tão-somente, a troca de cargos por apoio no Congresso. O famigerado toma-lá-da-cá.
Nunca canso de repetir que o apoio parlamentar é fundamental no contexto do nosso ultrapassado presidencialismo de coalizão – em que a maioria é formada depois de escolhido o chefe do Executivo. Não há desconformidade que uma base aliada reparta espaços de poder entre seus membros. Entretanto, o que estamos vendo nos últimos anos, e com mais gravidade agora, é que o governo se permite ficar refém desse vezo político. Abre mão de toda e qualquer estratégia, até mesmo de comando, para acomodar-se ao modo de agir mais desgastado da República.
Isso tudo é culpa do atual governo, sem dúvida. Mas não se pode esquecer as regras que estimulam esse processo. E tampouco de outros atores, tais como o PMDB, meu partido, que vem desempenhando um papel lamentável nesse contexto. A maior agremiação partidária do país, com identidade ligada à democracia, está perdendo mais uma oportunidade histórica. No lugar de exercer uma função moderadora, republicana e construtiva, focada no futuro, o comando da sigla opta e reforça o pragmatismo por ele mesmo. Focado em nacos de poder, não apresentou qualquer formulação original para sair da crise, senão que apenas se contentou com mais cargos e salários. Uma lástima.
A oposição tem um desempenho que costuma variar do sofrível para o oportunismo, ressalvadas as exceções. Há quem queira, para surfar na onda do desgaste do governo, promover um caminho que desvia as regras institucionais. São os que têm conseguido maior espaço na mídia. Outra grande parte, embora tenha maior prudência nesse aspecto, não consegue apresentar uma agenda para o país. As forças contrárias ao PT, também elas, lamentavelmente, estão enredadas em uma discussão limitada ao projeto de poder em curso ou em sua substituição.
Não bastasse tudo isso, o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) acaba de aprovar a criação de mais dois partidos. Chegamos perto de 40 agremiações com direito a tempo de rádio e televisão, verba pública oriunda do fundo partidário e uma chance enorme de fazer negócios escusos por dentro das franquias democráticas. Admitamos que Marina Silva, com sua Rede Sustentabilidade, tenha legitimidade para a legenda. Mas não é razoável, mesmo no caso dela, que figuras independentes saiam a fundar siglas para chamar de suas. As leis políticas e eleitorais do Brasil precisam mudar urgentemente.
E na economia, continuamos nas mãos de Joaquim Levy. Isso não é tão ruim quanto alguns acham, mas o remédio a ser aplicado por ele deve ser bem dosado. Técnico respeitado, o atual ministro da Fazenda tem uma pauta definida. Está decidido a dar solvência ao país. Mas demonstra alguma dificuldade em perceber toda a complexidade do mercado. O setor produtivo não pode perder o oxigênio, pois precisa continuar gerando emprego e renda. Não se combate recessão com mais paralisia. Todavia, é sabido e consabido que o ajuste fiscal é condição para a manutenção da estabilidade. E Levy não pode ser atrapalhado nessa meta.
Ora, não há como sonhar desse jeito. Não há utopia que pare em pé. Não há otimismo que não se transforme em tolice. O quadro político que estamos vivendo conduz o Brasil para um cenário de dificuldades ainda maiores. As recentes mexidas ministeriais não darão a sustentabilidade que a presidente pretendera. Foi apenas um arremedo, anunciado como grande feito, mas sem envergadura para ir além de alguns meses. E não toca com profundidade no custeio e nos exorbitantes gastos do governo. São sacrifícios de perfumaria.
Queria crer em algo diferente, mas falsas expectativas não devem ser estimuladas. A realidade que vivemos, circunstancialmente, tem essas tintas que acabei de expor. É difícil saber onde tudo isso vai desembocar. Mas, se há algum fio de esperança, e sempre há, ele está no reclame consciente da própria sociedade. Por vias cívicas e democráticas, os brasileiros precisam exigir um novo rumo – novo nos métodos, nos valores, nas práticas, nos projetos. Só um ímpeto social, seguido de profundas reformas estruturais, recolocará o Brasil nos trilhos. E permitirá fazer surgir, então, um otimismo realista.




