8.09.2015
Não é hora de aventuras
por Germano Rigotto
Algumas articulações políticas, detectadas pela imprensa, estão postulando a saída de Joaquim Levy do Ministério da Fazenda. Os posicionamentos são cada vez mais incisivos e ostensivos. A tentativa tem origem especialmente em alguns segmentos do partido da própria presidente da República. Setores mais ortodoxos debitam o desgaste do governo e a própria recessão econômica à política implantada por Levy.
Há, porém, um erro brutal de avaliação política e estratégica nessa seara. A atual crise pela qual passa o Brasil nada tem a ver com o ministro. A origem é mais remota, notadamente quando o governo começou a fazer, sob o ângulo da sustentabilidade econômica, gestão temerária das contas públicas. Ou seja, o início se deu quando o foco meramente eleitoral sobrepôs-se a qualquer outro, inclusive o de responsabilidade fiscal.
Não é demais lembrar que a presidente Dilma foi ao rádio e à televisão, em cadeia nacional, para anunciar a diminuição do preço da energia elétrica. Os especialistas, à unanimidade, diziam que o ato era um equívoco – que se comprovou não muito tempo depois. As maquiagens fiscais, embora não tenham sido inauguradas pelo atual governo, foram flagrantemente intensificadas, ampliando o quadro de deterioração da imagem externa do país. A Argentina já cometera esse erro há não muito tempo. Não poderíamos, também nós, colocar em risco um dos pilares da estabilidade macroeconômica.
Outra questão relevante: ano após ano, os gastos públicos vieram exorbitando cada vez mais. Não extrapolamos apenas em números de ministérios, mas também no tamanho da estrutura estatal, que é desproporcional à quantidade e à qualidade do serviço prestado à população. Fomos inchando a máquina a tal ponto que a despesa foi superando a receita, gerando necessidade de ampliação da carga tributária. Basta ver que a soma de tributos, que montava 25% do PIB em 1991, está hoje na faixa dos 34%. Desde lá, a despesa cresce acima da evolução da economia e da renda nacional.
O que Joaquim Levy tem em suas mãos, portanto, é uma dura herança. Ele foi chamado para cumprir uma missão difícil, onerosa, até mesmo antipática. Mas necessária. Não faria isso sem contrariar interesses, comprar brigas, bloquear ideias supostamente benéficas e, inevitavelmente, gerar alguns contragostos políticos. Ele está aí muito mais para negar do que para assentir. Logo, não se pode debitar ao mesmo a situação em que nos encontramos. Levy é um tecnocrata – e, inclusive por isso, precisa ser blindado e protegido. Caso contrário, não cumprirá sua missão. Ou cansará por si mesmo, ou cansarão dele.
Isso não significa que tudo o que o atual ministro esteja fazendo é adequado. Eu mesmo, nos espaços que ocupo, tenho criticado o excessivo esticamento da corda. Explico: se é verdade que o Brasil precisa de um freio de arrumação, também é verdade que o setor produtivo não pode minguar. Com o consumo já em retração, não será a taxa de juro a melhor ferramenta para conter a inflação. Os preços administrados, ligados ao próprio governo, estão na raiz dessa alta. O mercado precisa manter oxigênio para um mínimo de subsistência e competitividade. Mas a última reunião do Copom (Conselho de Política Monetária do Banco Central) foi um alento, uma vez que estancaram a majoração da taxa Selic.
Outra tarefa que não está sendo devidamente cumprida é o corte de gastos. E isso sequer é função direta ou ao menos exclusiva do ministro Levy, mas de todo o governo. Como procurei demonstrar acima, esse é um dos pilares da crise atual. Diminuir ministérios e cargos de confiança é uma boa iniciativa, mas há um número infinito de supérfluos que ainda podem ser reduzidos. É preciso rever contratos, estruturas, sobreposições, terceirizações, convênios, enfim, todo o emaranhado de torneiras pelas quais sai o dinheiro público. Essa é uma tarefa que o Brasil ainda não cumpriu.
Então, se não está bom com Joaquim Levy, certamente pode ficar pior sem ele. Há muitos pontos a corrigir em sua condução no Ministério da Fazenda, mas uma nova instabilidade, neste momento, seria o pior dos mundos para o país. Se isso ocorresse, certamente as avaliações de risco rebaixariam a nota brasileira – só para ficar nesse exemplo. Mergulharíamos numa onda ainda maior de desconfiança e incerteza. A hora, portanto, é de maturidade e serenidade. Já ficou claro que jogar para a torcida não é o melhor caminho.




