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4.05.2015

Pacto federativo na pauta

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Quando me pedem para apontar a reforma estrutural mais necessária para o país, eu costumo dizer que não é uma só, mas são três: a política, a tributária e a do pacto federativo. A ordem não é de preferência ou importância. Todas elas, a meu juízo, tem equivalência e são até mesmo interdependentes. Cada uma atua num importante pilar de sustentação do país, seja ele institucional, econômico ou social.

Falei novamente sobre esse tema no último final de semana, quando participei do 16º Encontro do Fisco Estadual Gaúcho, promovido pela Afisvec (Associação dos Fiscais de Tributos Estaduais do Rio Grande do Sul) e pelo Sindifisco (Sindicato dos Servidores Públicos da Administração Tributária do Estado do Rio Grande do Sul). No painel que coordenei, com a presença de Everardo Maciel, ex-secretário da Receita Federal, mostrei que, o novo pacto federativo tem tudo a ver com ética e qualidade nos serviços públicos.

Ocorre que, há poucas semanas, a Câmara dos Deputados instalou uma comissão especial para tratar do assunto. O objetivo é elaborar uma proposta que altere as competências, as atribuições e as fontes de financiamento entre as esferas federal, estadual e municipal. Em outras palavras: definir novamente quem faz o que e de onde vem o dinheiro para custear cada responsabilidade. Hoje há uma generalizada confusão nesses papeis. Há tarefas que estão sobrepostas e outras, desassistidas. Não são poucos os casos em que os três entes fazem a mesma coisa – e, até por isso, todos fazem mal.

A União concentra mais de 60% do bolo tributário da nação. Trata-se de uma clara contradição com a própria constituição social do Brasil, uma nação de dimensões continentais, diversa em suas realidades e complexa em sua organização comunitária. Não há gestão capaz de ser minimamente fidedigna, desde um poder central, à realidade das mais diferentes localidades.

O passeio do dinheiro público, gerado por esta concentração na União é terreno fértil para a corrupção, o fisiologismo e o clientelismo. Municípios e estados têm relevância e representatividade perante as populações que os vinculam. Não é admissível, portanto, que estejam sem autonomia para construir alguns quilômetros de asfalto, ou unidades de saúde ou escolas. Não raramente acontece que o governo central entrega uma obra, restando o custeio – em pouco tempo, superior ao valor do prédio – para a municipalidade adimplir. A toda evidência, isso não está correto.

Lá atrás, na Constituinte de 1988, os constituintes tiveram a boa intenção de ampliar o papel de municípios e estados como entes federados. Tanto foi assim que a Carta mandou compartilhar as receitas advindas de novos impostos. Mas, aos poucos, a União criou o subterfúgio das contribuições sociais – um tipo de tributo que por não ser imposto não exige a contrapartida. O resultado prático é que as competências locais aumentaram sem uma proporcional fonte de financiamento. Outro nó a ser desatado desse mesmo novelo a falta de regulamentação da Lei Kandir, que pune estados exportadores. No mesmo diapasão, entra a dívida dos Estados. E por aí afora.

Ao criar a comissão especial, o Congresso abriu uma oportunidade para aprofundar essa pauta. Sempre sou cético sobre iniciativas repentinas. Muitas reformas ficarem pelo caminho nas últimas décadas, infelizmente. Mas a oportunidade está posta. E, como se vê, a temática do pacto federativo é um bom mote para debater todas as outras reformas. Ou melhor, é um bom mote para reorganizar a estrutura do país.