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8.12.2014

Evidências de uma Federação desunida

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A alteração da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), que recebeu o aval do Congresso na última semana, simboliza muito mais do que uma manobra fiscal para maquiar o descumprimento da meta do superávit primário. Essa decisão histórica expõe, sobretudo, a fragilidade do sistema de troca de favores que se tornou a liberação de recursos para emendas parlamentares.

Na prática, o governo abriu os cofres e anunciou mais de R$ 444 milhões de reais em repasses. A condição era que os deputados e senadores aprovassem a mudança na legislação. Deu certo, e a medida reduziu a meta de superávit para 2014 – passando de R$ 116,1 bilhões para R$ 49,1 bilhões. Se isso não ocorresse, o Planalto se encontraria em uma encruzilhada e não conseguiria fechar as contas do ano, desrespeitando a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF).

A mobilização do governo expõe, com rara clareza, o expediente de toma-lá-dá-cá que tem caracterizado há muitos anos a relação entre o Legislativo e o Executivo. Além de desgastar e colocar em risco as instituições envolvidas, esse tipo de barganha aumenta a irresponsabilidade fiscal e o descontrole nos gastos públicos.

Diante desse episódio, pelo menos duas medidas imediatas devem ser tomadas. A primeira delas é a extinção das emendas individuais, que virou moeda de troca de parte dos congressistas. Por meio delas, instrumentalizam seu próprio projeto político. O interesse eleitoreiro se sobrepõe ao bem comum. Não há justificativa para isso, sendo que as alterações no orçamento poderiam muito bem ser feitas por meio da bancada ou de comissões e relatorias.

Tão urgente quanto isso é a revisão do Pacto Federativo. De todo o bolo orçamentário, cerca de dois terços são destinados à União. Aos estados e municípios, cabe o fardo de ir até Brasília em busca de migalhas. Para haver esse repasse, o dinheiro público passeia – e se perde parte dele no caminho.

Na viagem dos recursos, vale ressaltar, o contribuinte vê o valor dos impostos saindo do seu bolso em velocidade supersônica. O retorno, por outro lado, ocorre a passos de tartaruga. Os três entes federados não têm clara noção de suas próprias atribuições. Batem cabeça e não chegam a lugar algum. Enquanto isso, o serviço público torna-se sofrível.

Esses são dois dos mais graves causadores de corrupção, fisiologismo e clientelismo no Brasil. Sem o fim das emendas individuais e a revisão do Pacto Federativo, não há como definir claramente quem deve fazer o quê – e a partir de qual fonte de financiamento.

O episódio da mudança na LDO mostra que se gastou muito mas sem termos as melhorias necessárias na qualidade do serviço público. É um sinal da Federação que temos: distorcida, viciada e desunida. Não há como mudar esse quadro sem que haja um horizonte de mudanças e de reformas estruturais. Por um país mais ético, moralizado e eficiente, é preciso reconectar nossas instituições entre si – e com a vontade dos brasileiros.