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22.09.2014

Eleição: consciência e sistema

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A democracia se exerce no cotidiano. A política, idem. A eleição, porém, é o auge da dinâmica da representação. Não é o único momento, mas é o principal. Todos os cidadãos são chamados a escolher quem tomará decisões que importarão para a vida de todos. Convenhamos que isso não é pouca coisa.

Todavia, ao contrário do que se busca, os pleitos têm motivado o afastamento entre o eleitor e o candidato. O auge se transforma em mero sopé. A festa, em frustração. A participação, em omissão. É um problema de consciência política do brasileiro, sem dúvida. Mas é também um problema do nosso sistema político-eleitoral.

Estamos diante de um círculo vicioso. A disputa pelo voto, que deveria motivar a proximidade do cidadão, tende a distanciá-lo ainda mais. E o cidadão, que deveria buscar essa aproximação para fins de qualificar seu voto, prefere cultivar a aversão.

O que temos aí, portanto, é causa e resultado de muitas das contradições da política brasileira. Quanto mais a população estiver desinteressada pelo poder, mais seu exercício ficará em dissintonia com as necessidades reais. Quanto menos as regras conseguirem legitimar a representação da população, menos as pessoas se perceberão como parte da política.

O ato de representar pressupõe certa proximidade, seja de ideias, seja até mesmo de regiões. Nosso sistema não consegue contemplar nenhuma dessas duas realidades. As campanhas viraram uma disputa de quilometragem e de votos pingados. Candidatos rasgam o estado tentando criar pequenas militâncias de apoio, normalmente em troca de liberação de emendas ou outros favores no futuro. Na maioria das vezes, não há uma relação orgânica, mas apenas pragmática.

Nosso modelo também facilita a eleição de representantes de grupos de interesse, muitos dos quais absolutamente legítimos. A questão é que o Congresso Nacional acaba fatiado por pequenos núcleos, pluripartidários, que defendem ora corporações, ora setores econômicos, ora grupos esportivos, e assim por diante. O candidato conceitual, preocupado com grandes questões do país, tem dificuldade de comover adeptos.

O erro começa também dentro dos partidos. Hoje, bem diferente de critérios como identidade de ideias e valores, as agremiações buscam quem tem potencial de voto, independente de qual seja a motivação. Os acordos são celebrados com base meramente quantitativa, sem ouvir verdadeiramente as bases, passando ao largo de qualquer coerência.

Não é tempo de desânimo, porém. Por mais que os ventos soprem em sentido contrário, nada tira o poder do voto consciente. E a eleição, mesmo com todas essas contradições, continua sendo uma arma poderosa para corrigir os rumos, mandar recados, fazer escolhas e melhorar a situação do estado e do país. E esse é um exercício indelegável. Ninguém pensará por nós. Ninguém nos substituirá diante da urna eletrônica.