26.03.2012
Resistência à chantagem e ao fisiologismo
por Germano Rigotto
A história se repete: insatisfeita com a eventual falta de favores do Palácio do Planalto, setores da base governista fazem movimentos – às vezes explícitos, noutras sorrateiros –, para obstruir votações e atrapalhar os rumos que o Executivo quer dar ao país. Em virtude de pleitos individuais ou paroquiais, certos parlamentares brincam com o futuro da nação. Subjugam questões importantes ao aceite de suas querelas e barganhas.
As palavras são fortes, mas precisam ser ditas com todas as letras. Caso contrário, continuaremos legitimando uma atuação que não coloca o interesse público em primeiro lugar, como já se viu em outros momentos. Claro que negociar votações faz parte do jogo democrático, contanto que as razões desse acerto tenham respaldo no conteúdo em debate. O jogo baixo é que não pode mais ser aceito como plausível.
E sequer entro no mérito dos projetos que agora estão em análise. Falo de uma prática que, infelizmente, se acostumou à paisagem do parlamento brasileiro: o voto do deputado ou do senador precisa ter um preço de ordem pecuniária – que, na maioria das vezes, se expressa em forma de atendimento de emendas individuais. E assim tocamos o cotidiano, como se esse procedimento – e a aceitação dele – fossem uma inevitável forma de fazer política em nosso país.
Está evidente que, em primeiro lugar, estamos diante de um problema do próprio sistema. A configuração das nossas regras conduz como que naturalmente, ou ao menos facilita, essa postura. Temos um presidencialismo excessivamente centralizador e uma separação de poderes sem justa interdependência. Um parlamento coadjuvante, amarrado, sem liberdade. Porém, mesmo com os equívocos institucionais, há margem para uma ação pessoal com procedimentos mais qualificados.
A presidente Dilma tenta adotar uma reação diferente à de seus antecessores diante desse contexto. E muitos veem risco nessa sua intenção. Alguns, inclusive, julgam que ela estaria cometendo um grave erro. Todavia, dependendo de como ela vier a configurar essa resistência, o gesto pode ensejar consideráveis avanços à cultura política nacional. Ninguém postula os arroubos da era Collor, tampouco que o governo vire as costas para o parlamento, mas apenas um posicionamento mais assertivo, transparente e interessado no bem comum.
O Brasil está dizendo que quer isso, basta ver as pesquisas. É preciso dar um não ao fisiologismo, ao carguismo, à nomeação sem critério de apadrinhados, à distribuição de verbas por conveniências eleitorais, ao voto vinculado a um favor. É preciso – e é possível – centrar mais a pauta do Congresso no interesse do Brasil. Isso não significa simplesmente chancelar tudo o que vem do Executivo, mas analisar as matérias com profundidade e decidir sobre elas – seja contrária ou favoravelmente.
Que a presidente Dilma, portanto, não se renda ao jogo baixo. E que tenha competência política e inteligência emocional para encontrar o ponto ótimo entre os problemas do sistema, a má postura de alguns parlamentares e a boa postura de outros tantos que lá estão. Porque, sim, há congressistas efetivamente preocupados com o país. Não podemos perder a crença em acertar e fazer o melhor, mesmo que, pelo caminho, alguns cristais possam ser quebrados.




