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28.11.2011

Reforma ministerial: qualidade x quantidade

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Era compreensível que a presidente Dilma precisasse sustentar estruturas políticas previamente montadas. Afinal, as configurações que estiveram na base de sua vitória praticamente impunham tal contorno. Porém, a engenharia criada por Lula funcionava melhor sob o seu próprio comando: um líder carismático, com carreira pública orgânica, formado e experimentado no sindicalismo e na realidade partidária existente. Já os maiores méritos de sua sucessora residem em outra dimensão. Dilma tem olho no resultado, valoriza o método, é mais apressada e possui menos habilidade para gerir vaidades. Não se trata de discutir certo ou errado, melhor ou pior – apenas de constatar que estamos diante de perfis diferentes.

Nesse sentido, a anunciada reforma ministerial é uma oportunidade única – e histórica, eu diria – de o atual governo imprimir definitivamente seu modo de agir e construir marcas de gestão perenes. Ter uma equipe sintonizada, especialmente com quem a comanda, é algo fundamental no cotidiano de qualquer administração, seja ela pública ou privada. Na Presidência da República, não é diferente, principalmente em um sistema em que as figuras de Chefe de Estado e de Chefe de Governo se centralizam em uma única pessoa. E Dilma precisa fazer isso imediatamente, sem desperdiçar a oportunidade que se avizinha, tomando para si, integralmente, a decisão sobre o contorno ministerial que ela própria deseja.

Mais que sintonia, Dilma precisa encontrar o ponto ótimo da qualidade. Não é mais admissível que, em pleno século XXI, o Brasil naturalize a nomeação de agentes políticos sem qualquer identificação com a área que está sob os seus cuidados. Não basta apenas ter voto. Ocorre que esse não deve ser critério para excluir, tampouco para incluir qualquer pessoa. Mas é producente que, ao menos, o indicado tenha alguma espécie de vocação, conhecimento ou interesse pelo setor. Alguma afeição, ainda que não seja um técnico ou expert. E no rol de ministros – esta constatação vale também para os governos anteriores – há vários deles, não todos, que são meros figurantes de interesses partidários mais comezinhos e varejistas. É preciso, pois, profissionalizar a gestão, lógica que vem sendo defendida pelo empresário Jorge Gerdau, presidente da Câmara de Gestão do governo federal.

Há também o dilema da quantidade. Não é razoável, prático e austero trabalhar com 38 ministros. Duvido que a presidente tenha tempo de despachar com todos de maneira cotidiana, o que seria recomendável. As especificidades de alguns ministérios não justificam esse tratamento institucional. Não que suas causas sejam secundárias, mas um sistema mais otimizado na Esplanada permitirá, inclusive, que essas demandas tenham um transcurso mais rápido, objetivo e eficaz. A existência de um ministério para cuidar de área tão pontual pode, ao contrário de dar relevância à temática, relegá-la ainda mais ao lento andor da máquina pública.

A estabilidade política do regime presidencialista brasileiro passa pela coalizão partidária que tem sido formada pelos últimos governos. Porém, os presidentes não podem descer ao ponto de abdicar de suas prerrogativas na escolha de auxiliares mais próximos, simplesmente delegando tal tarefa ao primeiro escalão das bancadas que integram a base aliada. É possível vislumbrar até mesmo uma inconstitucionalidade teleológica, isso porque a livre nomeação e a livre demissão dos ministros é um direito e um dever de quem comanda o Executivo. A contradição de nosso sistema é tão esdrúxula que, no Legislativo, é o governo quem mais influencia; já do outro lado da Praça dos Três Poderes, a situação se inverte: deputados e senadores é que definem executivos. Temos um presidencialismo com desajeitados arremedos parlamentaristas. Porém, até que não avancem reformas mais profundas – algo que não se vislumbra num horizonte próximo –, essa é a realidade de que dispomos e com ela precisamos lidar.

De novo: não há problema que partidos sugiram nomes de seus respectivos filiados, sejam eles deputados, senadores ou demais detentores de mandato. Porém, há que se ter um critério mais apurado de escolha, privilegiando sempre a competência para o exercício de determinado cargo. Também é preciso reduzir o número de ministérios e cargos de confiança, simplesmente porque tamanha quantidade é desnecessária e até mesmo antiprodutiva para o bom andamento da máquina administrativa. São duas direções que, se sobre elas a presidente Dilma basear a próxima reforma ministerial, com certeza, darão um desenho mais promissor ao seu governo.