7.11.2011
Mitos que se vão
por Germano Rigotto
Nunca é demais observar as lições das grandes crises mundiais. A atual está sendo profícua na derrubada de mitos – não só econômicos, senão que também culturais, políticos e institucionais. O caso da Grécia, por exemplo, mostra uma estranha aversão do país a quaisquer medidas que possam representar um sacrifício imediato. A nação está à beira da bancarrota e, mesmo assim, sua classe política e a própria população não conseguem encontrar pontos de convergência capazes de aceitar alguns apertos e, gradativamente, reconstruir a estabilidade. Resta evidente que, por trás dessa postura, está uma formação que, no esteio de muitas facilidades, flertou excessivamente com o risco. Houve uma dissociação, que agora se vê de maneira muito clara, entre um desenho de realidade e a realidade propriamente dita. E os gregos parecem não acreditar que agora se descortinou a situação real.
Esse choque, de resto, se faz sentir em toda a Europa, bem como nos Estados Unidos e nas demais nações desenvolvidas. No comando do Fundo Monetário Internacional e das maiores organizações financeiras do planeta, esses países sempre agiram de maneira professoral na condução da economia mundial. Junto dos empréstimos que alcançaram ao Terceiro Mundo, sempre impuseram uma extensa lista de contrapartidas e exigências, principalmente no que concernia a corte de gastos. E não que estivessem totalmente errados em agir desse modo. Mas o paradoxo, que agora se revela, reside no fato de que, internamente, os próprios catedráticos não estavam aplicando as lições que propunham. O sistema financeiro é o exemplo mais flagrante disso, uma vez que se mostrou desregulado, descapitalizado e com baixa alavancagem – o que, por si só, implica forte risco de crise.
Pior: basta olhar o noticiário internacional para constatar que a ficha ainda não caiu. As medidas de ajuste não são mais do que tímidas e meramente conjunturais. Não se percebe um pacote profundo de austeridade fiscal e de aumento de receitas. Os grupos políticos locais, cada qual com seus apegos ideológicos, bloqueiam iniciativas numa ou noutra direção: uns resistem ao enxugamento, outros torcem o nariz para maior arrecadação. A velha e ultrapassada briga entre os conceitos de Estado Máximo e Estado Mínimo é um triste adereço desse cenário. São pensamentos estanques e empedernidos, incapazes de se adaptar à condição premente. Tudo isso derruba o mito de que europeus e norte-americanos são detentores de uma categoria intelectual e civicamente superior. Há, bem se vê, sérios problemas também pelas bandas de lá nesse quesito.
Que fique claro, porém: nada disso deve ser encarado como um mote de vingança por parte das nações emergentes. Pelo contrário: os erros cometidos precisam servir de pedagógicas lições para quem está em franca expansão, como é o caso dos BRICs. Até porque ainda há, também por esse lado, um mar de problemas a solucionar – ou alguém imagina que a economia chinesa é uma ilha feita só de certezas, coerência e solidez? Também não há indicativos de que o turbilhão inverterá a supremacia do G-7. As grandes potências continuarão exercendo forte influência global e, ademais, são detentoras de mérito em diversos aspectos: a distribuição de renda mais igualitária é um deles. Todavia, é certo que essas nações precisarão encontrar novos paradigmas de ação econômica, cultural, política e institucional. De qualquer maneira, a derrubada de alguns mitos ajuda o mundo a melhor compreender erros e acertos, avanços e atrasos, verdades e mentiras.




