13.10.2015
Comércio internacional e o trem da história
por Germano Rigotto
A estabilidade econômica deu ao Brasil a credibilidade que lhe faltava para fazer negócios no ambiente internacional. A expectativa de que contratos sejam cumpridos é condição para quem quer comerciar. Todavia, essa estatura é apenas a porta de entrada, o começo do processo de ingresso no mercado globalizado. A ampliação real da atividade comercial depende da ativação dos governos e empresas.
Mas, especialmente nesse caso, a iniciativa privada não consegue avançar sem que o setor público desbloqueie os caminhos. É tão simples quanto complexo: quanto mais clara e agressiva for a política de comércio internacional de um país, mais rápidos e maiores serão seus resultados. E também o contrário: uma condução confusa e errática gera efeitos mais lentos e menores.
Desde o advento do Plano Real, que inaugurou um período de maior credibilidade financeira do Brasil perante o mundo, nosso país aumentou consideravelmente suas exportações. Permeável, também abriu espaço para importados. Desde aquele período até hoje, e lá se vão mais de 20 anos, o país teve diversas iniciativas de estímulo ao comércio internacional. Entretanto, não conseguimos criar uma política vigorosa de relacionamento comercial com as grandes potências. Muitas empresas abriram os caminhos por conta própria, mas com muitas dificuldades.
Nos últimos anos, esse quadro se agravou. O Brasil fez uma aposta – a princípio, compreensível – no Mercosul. Porém, o acordo dos países latinos não prosperou. Mesmo assim, e aí o fio começou a virar, nosso país decidiu priorizar algo que não estava dando certo.
O que era uma escolha racional se transformou em discurso romântico, muitas vezes com redução ideológica. Em vez de abertura, virou fechamento. Sob o pretexto de reforçar o bloco regional, nossas relações exteriores de cunho comercial viraram medíocres perto do que ocorre em volta do globo.
A recente aprovação da Parceria Transpacífica (em inglês, TPP: Trans-Pacific Partnership), que envolve Estados Unidos, Japão e mais dez países, agrava ainda mais a apreensão do setor produtivo brasileiro – já combalido pela atual crise econômica. Diversos especialistas estão projetando grandes prejuízos para o país, com possível redução nas exportações e investimentos.
No caso da indústria, que exporta 35% dos produtos manufaturados para integrantes do novo tratado, já há sinalização de que insumos provenientes desses países vão tirar do mercado muitos brasileiros. O impacto não deve ser pequeno, pois a TPP envolve 40% do Produto Interno Bruto (PIB) do mundo.
A situação se complica para quem não está no grupo, pois esse conjunto de nações agora tem regras comuns, o que é decisivo no atual mercado de cadeias globais. O tratado envolve mudanças importantes na área de propriedade intelectual, serviços, mecanismos de soluções de controvérsias, compras governamentais, investimentos, mercado de trabalho, meio ambiente, empresas estatais e competição.
Logo, quem estiver contemplado nesse acordo tem um grande potencial de ficar mais atraente para o foco de grandes empresas internacionais. O Brasil, já frágil no comércio internacional – ocupa a 11ª posição entre as nações mais industrializadas –, tende a ficar ainda mais vulnerável.
Marcamos passo mais uma vez. Enquanto nações como Chile e Peru possuem mais de trinta acordos bilaterais, o Mercosul só celebrou três: com Israel, Palestina e Egito. As exportações para esses países correspondem, respectivamente, a 0,2%, 0,01% e 1% do total brasileiro. Tratados semelhantes não existem com os nossos grandes players.
Nosso bloco regional ainda tem um complicador adicional, pois permite que seus membros só negociem acordos de livre comércio em conjunto. Ou seja, bem longe de ter um pretendido papel relevante na definição de regras internacionais, estamos amarrados por Argentina, Uruguai, Paraguai e Venezuela. Todo o respeito às nações irmãs, mas esse coletivismo não pode chegar às barras da autoflagelação econômica. E é isso que estamos vendo.
A TPP ainda vai demorar em sair do papel, pois seus integrantes precisarão validar internamente as decisões. É um tempo oportuno para o Brasil flexibilizar sua política comercial e ampliar as negociações para além dos acordos multilaterais. Um tratado com a União Européia, que já vem sendo discutido há bastante tempo, deve avançar. Mas precisamos ir além.
Agora não se trata mais de escolha, mas de imposição das circunstâncias. O que de pior pode acontecer é a ausência do Brasil em negociações do porte da Parceria Transatlântica, gerando isolamento comercial e desvantagem perante os fortes concorrentes internacionais. Já ouviram falar de “trem da história”? Pois é. Creio que estamos diante de um desses vagões. E não podemos perder nossa vaga.




