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28.03.2011

A virada da China na questão energética

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A visão de longo alcance é um componente cultural comum aos povos orientais. Ao invés da tentativa de sucesso imediato, opta-se pela construção gradual com vistas para além do horizonte próximo. Portanto, é pensando nas próximas gerações que as decisões atuais são tomadas. Por trás da mansidão dos asiáticos, reside a convicção de que o futuro é tão ou mais importante que o presente. Essa tese se aplica tanto na vida pessoal quanto no terreno da gestão pública e dos negócios. Trata-se de uma característica estranha aos nossos olhos ocidentais, mas cujo legado é bastante visível – como bem evidencia a defesa dos japoneses diante da mais recente catástrofe natural. Eles esperaram e se prepararam para o pior.

Nesse contexto, a China vem tentando aplicar doses de sabedoria oriental para combater a devastação do meio ambiente, problema que tomou proporções globais. O país coleciona uma série de péssimos indicadores nesse sentido: é líder na emissão de gases que provocam o efeito estufa, possui 20 das 30 cidades mais poluídas do mundo, tem mais da metade de seu patrimônio hídrico comprometido e recebe chuva ácida em um terço de seu território. Além disso, apresenta forte dependência do carvão, explorado por eles da forma mais inadequada e danosa possível ao ecossistema – de maneira distinta, a propósito, do que é feito na região carbonífera gaúcha, que opera com práticas modernas e corretas.

O cenário desolador, contudo, caminha para alcançar algumas mudanças positivas. Os chineses demonstram disposição para dar a volta por cima e assumir a vanguarda em energia renovável. Um ranking elaborado recentemente pela Ernst & Young, que mede o nível de investimentos na área, torna essa constatação ainda mais clara: enquanto o Brasil derrapa na 18ª colocação – de um total de 30 –, a China ocupa a dianteira.

Sustentando tal desempenho, há um ambicioso programa governamental que exerce pressão em favor da troca de combustíveis fósseis por fontes renováveis. E que, sobretudo, procura reverter a nada lisonjeira liderança chinesa na emissão de dióxido de carbono. Tudo com prazos curtos e objetivos muito bem definidos. Cada uma de suas 22 províncias possui metas para tornar-se energeticamente mais eficiente. As empresas, sejam elas de grande ou pequeno porte, também têm atribuições pré-estabelecidas.

O governo faz sua parte através da maciça aplicação de recursos em fontes limpas e do incentivo à economia verde. O gasto do país em novos projetos eólicos já representa a metade de todo o mundo. A previsão oficial é de que, na próxima década, sejam investidos U$S 620 bilhões nessa matriz. Antes pouco significativas, as pesquisas sobre a questão energética se tornaram uma prioridade na academia e nas companhias.

Esse avanço é apenas um sintoma da idiossincrasia oriental. Em pouco tempo, a China ultrapassou um rol de nações desenvolvidas para tornar-se a segunda maior economia mundial, atrás apenas dos Estados Unidos. O que se vê agora são os frutos de uma reforma profunda – ocorrida há pouco mais de três décadas – em que os efeitos foram projetados para ocorrer com o andar do tempo.

A postura do dragão asiático enseja uma válida inspiração para o Brasil. Por óbvio, a nossa política energética precisa responder às demandas do presente. Entretanto, tão importante quanto isso é projetar os desafios vindouros. Os vastos recursos naturais do País são um belo ponto de partida. Resta fazer jus ao nosso potencial e entrar para valer na corrida pela economia verde.