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6.04.2015

Maioridade penal: a questão preliminar

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O tema da redução da maioridade penal para os 16 anos de idade se presta a discussões acaloradas. E não há qualquer problema nisso. São compreensíveis e até mesmo razoáveis as posições dos que defendem uma ou outra tese. Ocorre, porém, que a abordagem não pode resumir-se a essa dicotomia. Além da posição contrária ou favorável, é preciso averiguar o momento mais adequado para a aplicação dessa eventual mudança no sistema.

Explico. Não sou dos que consideram completamente inimputáveis adolescentes de 16 anos, mesmo os que tiveram pouco acesso a informações e bens de consumo. A técnica legislativa, inclusive, não permite fazer recorte de classe. A lei é sempre genérica, aplicável a todos os cidadãos. Pois bem. O jovem de hoje, mesmo o de menor poder aquisitivo, evoluiu muito em sua capacidade de compreensão da realidade – se compararmos, por exemplo, com os da minha geração.

Não há como negar, portanto, que o discernimento já compõe a personalidade de quem ingressou nessa idade. O juízo da realidade chega mais cedo aos adolescentes de hoje em dia, processo fomentado desde a família até a sociedade, a escola e os meios de comunicação. Além disso, vale observar que os diplomas legais brasileiros garantem outros direitos-deveres que são correlatos a essa visão. É o caso da faculdade ao voto, que pressupõe a mesma capacidade de absorção de valores e fatos. É plausível querer, então, que esses mesmos indivíduos respondam por seus atos criminais.

Como se vê, sou favorável à tese da diminuição da maioridade penal. Entretanto, há uma preliminar a ser superada – que considero condição para a proposta avançar. Refiro-me ao sistema carcerário brasileiro. Não há como ampliar a abrangência da persecução penal sem que, antes disso, o país possa ter mais vagas no sistema prisional. Não dispomos sequer de uma política concreta e duradoura para a área, o que seria o ideal. Mas, ao menos, precisamos de celas para que eventuais novos condenados cumpram suas penas.

Sem isso, a mudança legal fica inócua. Basta ver que diversos juízes estão liberando presos por falta de lugar nas penitenciárias. Ora, não há como alargar ainda mais o sistema punitivo se o Estado não consegue dar cabo ao cumprimento da pena. Além do aspecto quantitativo, há ainda o qualitativo a ser resolvido – tão ou mais importante que o primeiro. Ou seja, não há mais como conviver com as lamentáveis condições dos nossos presídios, que se transformaram em verdadeiras escolas do crime.

A União precisa liderar a mudança desse quadro, propondo uma grande política de construção de presídios e de ampliação de vagas carcerárias, além, claro, de um completo reestudo das penas e da própria gestão das cadeias. Isso deve ser feito em parceria com os estados e com a compreensão dos municípios, que muitas vezes se negam a receber casas prisionais. Essa resistência que precisa ser vencida em nome do interesse de todos.

É razoável prever a consequência de mudar a lei sem mudar a realidade carcerária: mais superlotação, mais impunidade e mais banditismo sendo fomentado por dentro do sistema. A diminuição da maioridade penal para os 16 anos pede passagem como um anseio da maior parte da população brasileira. Mas ela não pode virar mero texto legislativo, o que aconteceria dentro das condições atuais. Como disse, a preliminar a ser vencida é fazer com que o sistema carcerário tenha condições de receber mais apenados e, tanto quanto possível, recuperá-los.