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9.03.2015

Cenário preocupante

por

 

Uma crise só começa a ser superada quando ela é reconhecida. Isso vale tanto para a vida de indivíduos quanto para a de empresas, instituições, governos, nações e continentes. Fingir que não existe, minimizar ou fugir das responsabilidades só agrava a situação.

Digo isso para mostrar quão imperioso é reconhecer o difícil momento que o Brasil está vivendo. Antes de achar culpados aqui ou acolá, é preciso perceber que há – sim – uma crise instalada. E ela não é singela, rotineira, convencional. Não é como chuva de verão. A gravidade do momento foge da curva das últimas décadas. Suas proporções são consideráveis.

Há uma confluência de vários aspectos negativos. E podemos começar olhando para o cenário externo. A economia internacional está sem vigor. A Europa ainda enfrenta fortes problemas para reencontrar seu equilíbrio financeiro. Países emergentes desaceleraram o crescimento. A China baixou a velocidade de seu avanço.

A economia brasileira vai precisar passar por um freio de arrumação. Se, em alguma medida, isso era compreensível e necessário, em outra, agrava ainda mais a crise. O pacote do ministro Joaquim Levy vem para corrigir erros do passado, mas não gera oxigênio para o curto e o médio prazos. Com a alta de preços de combustíveis, energia e outros serviços essenciais, a recessão será inevitável. Ao lado disso, os juros também se elevam. O setor produtivo e os trabalhadores, especialmente os que ganham menos, pagarão a maior parte dessa conta.

Na política, os desencontros se sobrepõem. Embora as instituições estejam funcionando, a rivalidade e a tensão entre elas são cada vez mais visíveis. Pessoas se confundem com poderes. As proporções da corrupção na Petrobrás atingiram níveis estratosféricos. Estamos diante, inequivocamente, de um dos maiores escândalos mundiais. O Parlamento rivaliza na defesa de seus líderes e interesses. O Executivo demonstra incapacidade de adotar um diálogo fluente e permanente com sua base de apoio. Setores de oposição, sentindo a vulnerabilidade, devem fazer uma manifestação de grandes proporções no próximo dia 15.

Estão a caminho novas etapas do Petrolão. As delações prosseguem e, com elas, novas provas de corrupção irão aparecer, assim como o surgimento de mais nomes de políticos. O que provocará mais tensão no Congresso Nacional.

O Brasil segue deficiente em sua infraestrutura. Não há planejamento de longo prazo para a área. O mesmo se pode dizer dos setores de desenvolvimento, saúde, educação e segurança. O governo não conseguiu reduzir seus próprios custos, que cresceram em níveis desproporcionais nos últimos anos. E os mecanismos de transparência têm se mostrado insuficientes para precaver eventuais desvios. A sensação de impunidade e de descrença aumenta.

Não sou de desenhar cenários caóticos por antevisão. É sempre difícil prevê-los. Não dou como certo, portanto, que o país venha a derivar para uma situação de maior insustentabilidade. Até porque isso seria muito ruim para a nação, tanto interna quanto externamente. Mas não se pode ignorar que o momento não está propício nem mesmo para um pacto de conciliação e governança, por mais que alguns dos problemas sejam históricos.

Penso que só uma verdadeira pauta de futuro seria capaz de reposicionar o ânimo da nação, envolvendo o ambiente político, produtivo e social. Falo em propor mudanças estruturais, revendo modelos que estão superados desde a Constituição de 1988. Falo de reformar o país com um viés transformador, superando gargalos históricos e visões ultrapassadas.

Todavia, o atual establishment político dificilmente conseguirá isso, seja via Executivo ou Legislativo. Por esse motivo é que tenho defendido a convocação de uma Assembleia Constituinte Revisora Exclusiva. É a única ferramenta viável para que, num horizonte próximo, a nação volte a olhar para frente.