12.01.2015
Ajustar as contas, preservar a produção
por Germano Rigotto
As medidas anunciadas pelo ministro Joaquim Levy são tão duras quanto necessárias. Podemos questionar um ou outro aspecto, mas esse freio de arrumação, inclusive com uma clara política de ajustes, era preciso. Há tempos vínhamos alertando para o perigoso rumo que estava tomando a economia brasileira, com sérias repercussões internas e externas. Já a escolha dos nomes da equipe da Fazenda, com reconhecida capacidade, gera uma sinalização importante. É preciso, porém, que tenham proteção política para o trabalho que pretendem realizar. Caso contrário, as mudanças caem por terra.
Mas se os ajustes são necessários, eles não podem ser a centralidade do governo. Não são um fim em si mesmo. O setor produtivo, por exemplo, precisará ter um tratamento específico na pauta que se desenhará para os próximos anos. O déficit comercial brasileiro chegou US$ 3,93 bilhões, o maior já registrado pelo país desde 1998. As transações com os principais parceiros, à exceção dos Estados Unidos, pioraram. As exportações caíram 7% em relação a 2013, com um total exportado de US$ 225 bilhões. E as vendas de produtos manufaturados registrou uma gritante desaceleração de 14%.
Interessante notar que as importações tiveram queda de 4,4%, chegando US$ 229 bilhões. O dado pode soar como positivo em termos de equilíbrio na balança, só que a maior redução de compras no exterior foi de bens de capital – uma baixa de 7,6%. Isso reforça outra tendência sobre a qual sempre procuramos apontar em nossos espaços: a desindustrialização do país. As empresas estão deixando de comprar equipamentos destinados ao seu próprio fortalecimento, isto é, para produzir mais. Este comportamento mostra que o setor industrial está investindo menos em si mesmo, um processo que desmobiliza diversas outras áreas da economia.
A perspectiva do setor produtivo é positiva em relação à valorização do dólar perante o real. Isso fortalecerá nossas empresas tanto para as exportações quanto para a competição no mercado interno com o produto importado. No ano passado, a viés de queda da nossa moeda já se mostrava, mas isso tende a acentuar-se em 2014. Basta ver que o dólar, nesse período, já apresentou uma alta de 1,60%. Outras boas notícias são a recuperação da economia americana e a queda dos preços de petróleo, tudo ainda dependendo de uma confirmação mais perene.
Mesmo assim, o quadro para os empreendedores é de bastante dificuldade. Os juros seguem em alta, e a carga tributária deve aumentar. Há também uma tendência de aumento de tarifas públicas, muitas das quais estão represadas há bastante tempo. Isso trará efeitos negativos imediatos em termos de competitividade e da própria gestão das empresas. O clima do mercado global, que já era tenso no final do ano, tende a sentir os reflexos dos recentes atentados terroristas. É sabido que os acontecimentos políticos e sociais têm implicação econômica. A crise na Argentina nos afeta de maneira direta: em 2013, a soma das nossas vendas para os argentinos atingiu US$ 19,6 bilhões; no ano passado, esse valor caiu para US$ 14,2 bilhões. Tudo isso acontece sem que a pauta de reformas estruturais seja priorizada, o que aumenta o tom de pessimismo com as perspectivas.
O ajuste fiscal é apropriado, repito, mas ele não deve desconsiderar a dimensão da economia real, isso inclui quem gera emprego e os próprios trabalhadores. A revisão dos programas de incentivo, por exemplo, não podem desconstruir contratos que vinham dando certo. As denúncias de corrupção e desmandos devem ser tratadas com eficiência e sempre focadas nos casos concretos, sem generalizar tudo o que estava sendo feito. Enfim, o corte de gastos deve atingir supérfluos e irregularidades, mas sem prejudicar nosso resistente e muitas vezes esquecido parque produtivo. O Brasil precisa continuar se desenvolvendo, inclusive a passos mais rápidos.




