6.10.2014
O que exigir do segundo turno
por Germano Rigotto
Passamos pelo primeiro turno. A eleição, que mais uma vez ocorreu dentro da normalidade institucional da democracia, confirma o amadurecimento do Brasil nesse sentido. Podemos discordar das regras, dos rumos e até mesmo do resultado, mas a população foi às urnas e escolheu seus representantes. A luta pela redemocratização do país não vem tendo refluxos de qualquer espécie, à direita ou à esquerda, diferente do que aconteceu em outros países do nosso eixo continental. E isso já é um dado importante.
Nesta primeira rodada eleitoral, há um excesso de candidatos. E aí já estamos falando de uma das contradições do nosso sistema. Alguns, mesmo com pouco voto, têm posicionamento e legitimidade para a disputa. Outros, no entanto, visivelmente estão em busca de seus minutos de fama. Ou, quando ainda pior, apenas figuram para negociar apoio e vender espaços na televisão. Uma vergonha. Mas o maior mal que praticam é o de confundir o cenário: não agregam qualquer contribuição e, ao mesmo tempo, atrapalham o juízo do eleitor em relação aos candidatos com maior representatividade.
Pois bem. No segundo turno, esse dado muda. Agora o debate é direto, dual, sem interferências. É um contra o outro, seja nos estados, seja no país. Os eleitores terão melhores condições de avaliar os candidatos e suas propostas. Poderão depurar as contradições, analisar os posicionamentos, pesquisar a trajetória, ponderar as propostas. Haverá muitas oportunidades de fazer isso, não apenas nos programas de rádio e televisão, mas também nas inúmeras entrevistas que seguirão, nos debates, no cotidiano da campanha, nos procedimentos, nos gestos. Nem mesmo a maquiagem do marketing conseguirá esconder a real personalidade dos candidatos.
No Brasil, é preciso aprofundar a discussão dos temas que mais importam. Daqueles que realmente são decisivos para o futuro do país. No primeiro turno, infelizmente, isso passou ao largo da eleição. O excesso de candidatos e a falta de foco no conteúdo, além dos fatos extraordinários que surgiram durante o processo, fizeram com que as grandes questões ficassem de fora. As campanhas precisarão aprofundar-se, isto é, tornar as ideias mais tangíveis. Tirar dos planos de governo o que é intenção e mostrar sua possibilidade de aplicação prática, inclusive no aspecto político e financeiro. Ideias que têm custo, por mais maravilhosas que sejam, precisam vir com a indicação da respectiva fonte de financiamento.
Os concorrentes também devem ter mais clareza sobre os temas estruturais. A reforma política, por exemplo, precisa sair de um debate de intenções para um rol de propostas objetivas. O que cada candidato pensa sobre isso? O que pretende mudar e o que pretende manter? É um tema do Legislativo, sem dúvida, mas nosso sistema presidencialista já mostrou, diversas vezes, que nada acontece sem ou contra a vontade política do Palácio do Planalto. Logo, a reforma política passa, sim, pela condução do próximo presidente da República. E os candidatos precisam ser cobrados a respeito disso.
O mesmo vale para a reforma tributária. Não adianta o discurso genérico da diminuição da tributação ou da recusa ao aumento de impostos. Esses são pressupostos importantes. Mas tanto Dilma quanto Aécio precisarão dizer como fazer a reforma mantendo o equilíbrio fiscal e preservando o interesse da sociedade. A racionalização do sistema vai suprimir quais tributos? E o valor arrecadado será compensado ou cortado de que maneira? A reforma será gradual ou completa?
Idem para a revisão do pacto federativo. É unânime a intenção de rever o papel dos entes, suas funções e as fontes de financiamento. Mas quem deixará de fazer qual função? E quem passará a fazê-la? A diminuição do poder da União se dará em que medida e a partir de quando? Os municípios terão mais relevância na definição de políticas públicas, mas de que forma?
Enfim, eis o debate mais relevante. O aprofundamento sobre esses três grandes temas, para ficar só neles, já será decisivo para desenhar o Brasil que teremos amanhã. Por aí passa a superação da nossa estagnação econômica dos últimos anos e um novo upgrade no desenvolvimento da nação. Que a discussão não fique apenas no passado ou numa infértil disputa de paternidades. Que a política seja tratada com elevação. Tivemos conquistas relevantes nas últimas décadas. Mas agora precisamos ir além. E é do além que o segundo turno terá de tratar.




