24.06.2014
Avançamos, mas ainda não viramos o jogo
por Germano Rigotto
As medidas de incentivo à indústria, anunciadas na última semana, repetem um filme que já conhecemos: atacam problemas conjunturais, mas não enfrentam os estruturais. São todas elas positivas no mérito do que pretendem, mas insuficientes em relação às pendências de fundo. Senão, vejamos.
Uma preliminar: as iniciativas formalizadas pelo governo vão ao encontro da pauta do setor. Ajudam a melhorar a situação, sem dúvida alguma. E isso é virtuoso. O caso mais evidente é do Programa de Sustentação do Investimento (PSI), que será renovado até o final de 2015.
Fiz parte da luta pela criação e pela prorrogação desse projeto. No Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social, sempre procurei mostrar que o Brasil precisava de uma nova ferramenta para enfrentar a crise. E o programa, com juro de até 5,5% ao ano, cumpriu muito bem essa função. Não fosse por ele, muitos setores teriam um desaquecimento ainda maior. Na sequência, defendi que se mantivesse ativo.
Também é relevante o anúncio de recriação do Regime Especial de Reintegração de Valores Tributários para as Empresas Exportadoras (Reintegra), que agora passa a ter um caráter permanente. Esse diploma devolve parte dos impostos pagos por exportadores de manufaturados. Mas a eficiência vai depender da capacidade fiscal do governo para frente.
Outra alteração importante foi a remodelação do Refis da Crise, programa de renegociação de dívidas de contribuintes com a União. Empresas com pendências de até R$ 1 milhão precisarão dar de entrada 5% do valor para conseguir o parcelamento, não 10% como na regra atual. Essa ampliação do escalonamento segue também para montantes maiores. Em outras palavras, isso significa fôlego para organizações em situação de dificuldade fiscal.
Como é possível notar, não se pode dizer que as ações são tímidas. Mas algumas ponderações precisam ser feitas. As medidas anunciadas tendem a produzir efeito no médio prazo. Além disso, lamentavelmente, demoraram muito para acontecer. E, por fim, não vieram acompanhadas de reformas estruturais, isto é, de mudanças mais profundas e definitivas para garantir maior competitividade ao país.
O câmbio, por mais que continue flutuante, não pode apresentar picos de excessiva valorização do real. Isso tem um efeito devastador para a indústria. Fica difícil para exportar, bem como para competir com o importado no mercado local. É um fardo pesadíssimo para a produção nacional.
A taxa de juros brasileira fala por si. Não há visão conservadora que consiga justificar um patamar tão elevado, que tira oxigênio diariamente do nosso parque produtivo. A boa nova é que, segundo se especula, a próxima reunião do Copom não vai mais determinar o aumento da Selic. É o que todo o mercado espera.
Por último, resta a lacuna das reformas. O Brasil desistiu da pauta de rever o sistema tributário e, há décadas, vai de um arremedo a outro. Faz paliativos, melhora aqui e acolá. Mas, no todo, continua tendo um sistema absolutamente irracional e predatório para quem quer produzir e trabalhar, vitimando principalmente os mais pobres.
Merecem aplausos as medidas de incentivo. Mas, para usar uma linguagem futebolística em tempos de Copa do Mundo, elas não viram o jogo. Nosso principal adversário continua sendo interno, e atende pelo nome de Custo Brasil: câmbio, juro, carga tributária e gargalos na infraestrutura. Sabemos o caminho. Precisamos prosseguir e atacar ainda mais.




