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5.05.2014

Conceitos, estruturas e gerações que se chocam

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A internet despertou a dimensão empreendedora na vida de muitos jovens. Hoje é gigante a quantidade de startups no mercado, isto é, um modelo de negócios que nasce do desenvolvimento colaborativo de uma ideia – que passa a dar retorno financeiro. São empresas novas e ainda em fase de solidificação. Uma das principais características é o perfil dos seus gestores, normalmente com pouco mais de 20 anos e recém-formados. Outro dado é que essas organizações estão muito focadas nas oportunidades existentes no universo da tecnologia da informação.

Por tudo isso, são empresas essencialmente inovadoras. Nascem dentro da cultura online, sem necessidade de adaptação ao choque tecnológico que as gerações anteriores viveram. São, normalmente, resultado do esforço de pessoas que querem transformar suas habilidades, suas vocações, seus trabalhos em rendimento. Costumam surgir entre amigos, o que agrega uma afinidade natural. Muitas acabam recebendo investimentos de parceiros que apostam na rentabilidade da ideia no médio e longo prazos.

Esse é um dado da realidade do nosso tempo. É una boa consequência do boom tecnológico havido nas últimas décadas. A internet trouxe consigo diversos questionamentos em termos comportamentais e culturais, mas é visível a ampliação de possibilidades que gerou para pequenos empreendedores. Ao facilitar e agilizar a comunicação, encurtando distâncias e barateando o relacionamento de negócios, a web criou um novo marco na iniciativa privada. Empresariar, definitivamente, virou uma possibilidade ao alcance de muitos.

Todavia, quem ainda não se adaptou a isso foi a legislação brasileira, especialmente na área administrativa e tributária. Tivemos avanços importantes, como a criação dos diplomas legais do Simples Nacional e do MEI (Microempreendedor Individual). Mas isso é muito pouco para responder às necessidades de um jovem que, descapitalizado e pleno de ideias, quer abrir seu próprio negócio. Esses avanços tão-somente atenuaram suas dificuldades, e nada muito além disso.

Os entraves continuam em grande escala. O mero ato de abrir uma empresa envolve uma parafernália burocrática inexplicável para a era digital. E essa geração, por óbvio, tem dificuldade de lidar – e até mesmo de entender – tantos processos e retrabalhados. A “papelada” ainda é um desagradável designativo do mundo corporativo. A organização administrativa brasileira mantém um pouco dos rudimentos do Brasil imperial. A batida do carimbo do burocrata segue como poderosa chancela de que dependem grandes iniciativas. O problema não é o funcionário público, mas a organização institucional que burocratizou a sua função.

Na área tributária, a situação não é menos sufocante. As guias de arrecadação começam a chegar antes mesmo dos primeiros clientes e negócios fechados. Diante de qualquer sinal de respiro financeiro, o aparato estatal se apura em aumentar seu peso. E são entes de todos os lados e de todas as esferas a apresentarem suas guias de cobrança. Há um engessamento da capacidade de crescimento dos pequenos negócios, o que conduz a um nível escandaloso de informalidade – tanto de empresas quanto de trabalhadores. E esses assuntos continuam fora das prioridades da agenda nacional.

O talento dos jovens brasileiros é tamanho que, muitas vezes, consegue superar a adversidade burocrática e tributária que existe no país. Porém, muitos vocacionados para o empreendedorismo – que gera emprego, renda e desenvolvimento para a nação – acaba optando por caminhos com menos riscos. Até mesmo as famílias costumam conduzir seus filhos para fora dessa zona de perigo. E isso acaba desperdiçando os predicados de pessoas que poderiam entregar muito mais.

O empreendedor brasileiro tem um duplo desafio: vencer da concorrência e vencer do sistema. O primeiro faz parte do ambiente do mercado, mas o segundo é uma herança pesada e defasada. Quando falo em reformas, é justamente para fazer com que os nossos sistemas institucionais migrem da condição de adversários para parceiros de quem quer crescer. Falo de um Brasil que dependa mais dos próprios brasileiros e não tanto do estado. É isso também que o próprio povo quer, mas tem dificuldades de fazer acontecer.