Artigos em Destaque

 

7.10.2013

Um debate – e um país – que precisa evoluir

por

 

Com a decisão de Marina Silva, no último sábado, começa a ganhar forma o páreo da próxima corrida presidencial. Sem entrar no mérito da decisão tomada por ela, o fato é que a população terá uma terceira via como possibilidade de escolha. E isso, por si só, vai representar uma abertura do debate político nacional. Ora, não seria produtivo que a pauta da eleição se esgotasse na dicotomia entre as heranças tucana e petista. Seria absolutamente legítimo que o Brasil optasse novamente por uma dessas alternativas, mas precisa fazer isso numa perspectiva de futuro – e não de passado.

Quem analisa o cenário das últimas décadas com serenidade, mesmo fazendo parte de alguma agremiação partidária, consegue ver os avanços que a nação alcançou nesse período. É inegável que a estabilidade econômica, com o fim da inflação e a recuperação da credibilidade internacional, representou um marco notável escrito a partir do Plano Real. Também não há como deixar de constatar que os programas sociais, mesmo incompletos em relação ao que se chama de “porta de saída”, ajudaram a promover a ascensão de muitas famílias.

Igual serenidade de análise também vai permitir enxergar onde o país parou. Onde estagnou, estacionou, travou. E aí não há força midiática ou defesa política que consiga disfarçar ou esconder o que não deu certo. Refiro-me, por exemplo, às reformas estruturais, especialmente a tributária, a política e a revisão do pacto federativo. Estamos com pelo menos duas décadas de atraso nesses assuntos. Num sistema presidencialista com as configurações que o nosso possui, é ao Executivo que cabe puxar a frente dessas mudanças. Se tiver vontade política para provocá-las, o Congresso responde. Isso não justifica a falta de ativismo do parlamento, mas mostra que, pelas atuais regras do jogo, o presidente da República é o grande player político da nação.

Ora como deputado, ora como governador, ora como membro voluntário do Conselho da Presidência, fui testemunha presencial de todo esse nó – um nó que não desatou. Nos mandatos de Fernando Henrique, Lula e Dilma, até houve incipiências em relação às reformas. Em certos momentos, parecia que iam andar. Porém, diante das primeiras reações, o comando político já mandava puxar o freio. E isso vale para todas as gestões referidas. Nenhum dos presidentes, por mais que pessoalmente até desejassem fazer as mudanças, conseguiu levá-las adiante. Os interesses contrários vieram quase sempre das mesmas fontes, especialmente centradas nos setores mais conservadores da área fazendária e nos grandes escritórios tributaristas. Além disso, claro, houve a resistência de alguns governadores, que, absurdamente, continuam contrários à reforma do ICMS.

Inclua-se nesse rol de estagnações o gargalo da nossa infraestrutura. Vivemos um colapso no trânsito urbano e nas rodovias. As demais alternativas modais foram subjugadas. Nossos aeroportos são uma vergonha. E, mesmo no transporte convencional, o país investiu muito aquém do necessário. A população aumentou, a frota de veículos idem, mas nossas estradas só fizeram piorar. Locomover-se no Brasil virou sinônimo de caos, de custo e de perigo, seja para as famílias, seja para a produção. Não conseguimos conciliar o interesse da iniciativa privada em investir com a necessidade estatal de receber tais recursos. Emperramos o progresso e permitimos que uma lerdeza corrupta e burocrática vencesse o jogo das obras. É um preço que ainda vamos pagar durante muitos anos até virar esse jogo – o preço de não ter planejado o país para o tamanho que ele poderia ter.

A partir de tudo isso, fica evidente que o debate das próximas eleições presidenciais precisa ser centrado, equilibrado, útil. Mais: precisa ser revigorado, renovado, oxigenado. Isso significa olhar para frente, enxergar as necessidades reais e inaugurar novas matérias, sem ficar refém desta gangorra artificial que se criou. Volta e meia, a propósito, recebo reclamações por não radicalizar minhas opiniões diante da espécie de bipartidarismo em que querem enquadrar a todos. Compreendo que a simplificação da política causa mais repercussão, mas creio que esse viés quase sempre gera uma interpretação obtusa e incompleta da realidade. Ou mesmo demagógica, em cuja fonte definitivamente não costumo abastecer minhas apreciações.

O PMDB poderia ter exercido este relevante papel de propor uma nova pauta para o Brasil, mas faz tempo que abriu mão de qualquer protagonismo. Se o reforço de Marina à candidatura de Campos conseguirá ajudar a fazer esse aprimoramento do debate, só o tempo e a postura dos candidatos dirão. Mas, para além de quaisquer escolhas eleitorais, o Brasil precisará olhar para o horizonte, muito mais do que para o passado, em 2014. Reconhecendo conquistas, sem dúvida, mas especialmente enfrentando o que precisa ser enfrentado: seu contraditório sistema político, seu monstruoso sistema tributário, seu centralizador pacto federativo e sua esgotada infraestrutura. Recuperar a representatividade dos partidos e da política passa por isto: ir direto ao ponto. Ao ponto da população.