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16.07.2012

Eleição municipal: oportunidades e contradições

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A eleição municipal, por sua própria essência, permite um olhar mais detalhado e realista sobre o cenário político. Mais próximo, especialmente. E essa proximidade se dá em duas direções. Em primeiro lugar, quem vive numa cidade sabe de seus problemas. Não precisa de estudo, interlocutor ou densas teorias. As questões são cruas, reais, visíveis. A mentira tende a não sustentar-se. Em segundo, o eleitor também conhece os candidatos. Tem mais condições de identificar as virtudes e os defeitos de quem quer seu voto. É possível averiguar a história e a personalidade dos pretendentes para além da propaganda de rádio e TV.

Diferente da União e do Estado, que muitos especialistas identificam como ficções jurídicas, o município é o ente concreto da organização federativa. É nele que a vida efetivamente se dá. Um voto para definir o comando do local em que se vive é, portanto, um gesto de responsabilidade com a existência própria e dos próximos. É mais rápido e objetivo o caminho que divide um projeto de uma obra, por exemplo, mesmo com a concentração de recursos em outras esferas. É ali que as demandas reais buscam soluções mais imediatas. Os gestores públicos têm nome, sobrenome e endereço – não se escondem em gabinetes distantes, repletos de portas e anteparos.

Nesse contexto, é necessário ter em conta a importância das funções dos prefeitos e dos vereadores. Ao edil municipal, além de legislar, cumpre a função de ser uma caixa de ressonância da população. É ele que está ali, no cotidiano da cidade, sentindo e ouvindo as necessidades do mundo concreto. E se for competente, saberá ser esse canal de interlocução entre as pessoas e o poder local. O prefeito é o gestor, aquele escolhido para comandar as mudanças executivas. Uma escolha equivocada demandará quatro anos, no mínimo, de padecimento.

Ao largo dessa escolha, para uma visão mais global, esta eleição voltará a mostrar o desfile de contradições que se reúne em volta do nosso sistema político. E é uma situação que contribui para a visão de ojeriza que grande parte da sociedade nutre em relação à política. A primeira evidência que saltará os olhos é a excessiva quantidade de partidos no Brasil. Não que a lei deva inibir a livre organização partidária, mas não é razoável que nossa realidade contemple – até porque nem há ideologia para tudo isso – três dezenas de siglas. Muitas delas, infelizmente, se tornaram tão-somente legendas de aluguel. Máquinas de fazer negócio. E, apenas por existirem, fazem jus a uma parte do fundo partidário – dinheiro público, recolhido dos nossos impostos.

Outro lamentável fenômeno que se repetirá é a perigosa – e muitas vezes espúria – relação que se cria entre uma candidatura e seus financiadores.

É diante evidências como essas, duas dentre tantas existentes, que venho defendendo a proposta de convocação de uma Constituinte exclusiva. A cada dia reforço a certeza de que essa possibilidade viria totalmente ao encontro das necessidades do país. Defendo que essa assembleia seja criada para definir pautas específicas – especialmente a reforma política, reforma tributária e revisão do pacto federativo – e com prazo definido de um ano para conclusão de seu trabalho. Seus membros poderiam ser escolhidos em concomitância com as eleições de 2014. O eleitor votaria para eleger os congressistas ordinários e esses outros, de caráter extraordinário e temporal. Quem concorre numa, não pode concorrer noutra. Logo, haveria uma tendência em favor de nomes com maior densidade em conteúdo, mais independentes do interesse regional ou setorial.

Como o Congresso e esse grupo revisor atuariam em paralelo, sem interferências recíprocas, os constituintes não estariam preocupados com a próxima eleição, com as votações de governo e com os pleitos corporativos. A influência do Executivo, diferente do que ocorre hoje, deixaria de ser o condicionante mais importante. Eleita para tarefas predefinidas e com tempo fixo para cumpri-las, a Constituinte exclusiva necessariamente colocaria em marcha as reformas, tomando as decisões necessárias para isso. Além dos próprios partidos, os diferentes segmentos da sociedade poderiam mobilizar-se para compor um novo pacto constitucional.

Vejo essa ferramenta como a mais plausível e possível para conseguirmos fazer avançar as reformas estruturais, como é o caso da política. Nesse caso, especialmente, não é razoável esperar uma mudança que venha a ser feita por quem é beneficiário das atuais regras do jogo eleitoral. É preciso, portanto, constituir um grupo para criar esses novos ordenamentos constitucionais. E quiçá as eleições municipais, já tão relevantes para a vida das pessoas, alcance um patamar de ainda maior significado no cotidiano social.