12.09.2016
Novos parâmetros para preencher cargos públicos
A Operação Greenfield, deflagrada pela Polícia Federal na última semana, escancara um problema político que, há muito, prospera no Brasil: o aparelhamento da máquina pública e a indicação de nomes sem capacidade e idoneidade para participar de atividades diretivas. No caso em questão, os fundos de pensão de estatais. São organizações poderosas, tanto pelo poder financeiro e político que possuem, quanto pela responsabilidade junto aos seus integrantes. Os resultados têm reflexos na vida de muitas famílias.
Os investigadores examinaram dez casos. Em oito deles, constataram fraude ou gestão temerária de valores depositados pelos associados. O ilícito, normalmente, se dava pela compra de cotas de participação em empreendimentos por um valor superestimado. A ação da Polícia resultou em 147 mandados, num total de R$ 8 bilhões de bens bloqueados – principalmente de dirigentes dessas organizações. O rastro não ficou apenas nos crimes de enriquecimento ilícito e afins. Muitos fundos estão deficitários, pois o patrimônio acumulado não dá conta de todos os compromissos assumidos.
Só uma cadeia de contradições permite que se chegue a esse ponto. Claro que, como em quase toda ilegalidade, há a ação voluntária de alguém que decidiu delinquir. Mas, afora isso, o que fica claro é que o arcabouço legal e a prática política brasileira ensejam ou ao menos protegem a construção dessas redes criminosas. De outro modo, não seria possível que, num negócio que requer confiança e segurança, houvesse tantos rombos e desmandos.
E é nesses dois pontos que precisamos tocar. A lei não pode mais permitir que os fundos de pensão sejam geridos de modo tão displicente, temerário ou, como se viu, até mesmo criminoso. O acúmulo financeiro de tantas famílias precisa ser protegido por normas jurídicas severas, mais próximas às do mercado financeiro. Isso inclui a ampliação do papel dos órgãos de fiscalização e controle, bem como a configuração de novas regras de compliance e transparência. É preciso, pois, um mínimo de profissionalismo no ramo.
O outro aspecto é a cultura política que baseia o preenchimento de espaços desse tipo. Ser filiado a um partido não pode ser o único requisito. Não é razoável, e nem mais aceitável sob qualquer ponto de vista, que um indivíduo sem credenciais técnicas e éticas venha a ser responsável por gerir um fundo de pensão, por exemplo. Nem essa nem qualquer outra organização que trate com dinheiro ou mesmo com interesse público, por mais difuso que possa ser.
Essas mudanças, é bom que se diga, devem ocorrer por dentro da política. Refiro-me, especialmente, ao papel dos partidos e de todos os formadores de opinião. Não creio que uma visão de ojeriza à política possa contribuir – ao contrário, afasta ainda mais as pessoas de bem. A pressão popular, de modo cívico e quanto mais organizado possível, precisa influenciar e produzir essas transformações culturais. Trata-se de uma compreensão amplificada do papel da política, que valoriza os partidos e seus quadros, mas coloca em primeiro lugar o sentido da atividade pública: servir à população.
Isso não é teoria ou desejo distante. Muitos países já possuem um trabalho avançado em relação à gestão dos fundos de pensão e estatais em geral. São regras rígidas para ocupação de cargos diretivos, bem como punições severas para eventuais desvios. O Brasil pode e deve avançar nesse sentido, mudando, como se disse, a legislação e a cultura política. Isso ajudará, para além dos resultados diretos, a aumentar a credibilidade interna e externa do país. E credibilidade, neste momento histórico, é um dos maiores ativos de que precisamos.




